Anjos comunitários da saúde

Prevista em lei específica, a categoria dos agentes comunitários de Saúde vem prestando um grande serviço à Saúde em Cuiabá e em todo o Brasil, agindo como verdadeiros interlocutores do Programa Saúde da Família e levando às famílias orientação e promoção de bem estar. 

Infelizmente, em desproporção com sua importância social, estes 710 heróis, como a maioria dos servidores públicos do país, vêm recebendo um tratamento indigno por parte da Administração Pública. São pessoas que conhecem as reais necessidades da região que assistem, gente do povo que leva ao conhecimento e providência da equipe multidisciplinar das Unidades de PSFs, formada por médico, enfermeiro e técnicos. 

Embora de impacto extremamente positivo na estratégia sanitária, no combate às endemias e epidemias, são tratados com pouco prestígio suportando remuneração aquém da a que fazem jus. Ainda não conquistaram nem mesmo um Plano de Carreira e vêm servindo de coadjuvantes muito mais políticos do que técnicos. Para figurarem em propagandas e envaidecerem o ego dos gestores são de grande serventia, mas só quem conhece a sua situação pode imaginar como carecem de mais consideração. Tarefas insalubres e desgastantes são sua rotina. 

O Programa destes agentes comunitários faz parte da estratégia do Ministério da Saúde no âmbito das comunas, entes competentes para gerir a Atenção Básica. Por isso, tanto a Lei nº 10.507/2002, no seu art. 4º, como a Portaria n° 1.886/1997 (MES), no subitem 7.6 do seu Anexo I, preveem que este funcionário prestará seus serviços ao SUS local. 

Penso que este também seja um caso de desvalorização profissional. Sem o devido incentivo logístico e humano, não conseguiremos resultados razoáveis em área administrativa alguma, ainda menos nesta que representa a principal deficiência de nossa capital. Respaldado pela autoridade de ser um ex-companheiro de atuação, certifico o quanto imprescindíveis são estes promotores da qualidade de vida. Sou testemunha do quanto fazem a diferença. Sem sua interferência, toda estrutura bem-sucedida da Saúde Coletiva que conhecemos atualmente está fadada ao insucesso e voltaremos à Medicina de 30 anos atrás. 

Passamos por uma trágica e disseminada degradação dos direitos trabalhistas. Nunca se presenciou tanta manifestação contra políticas de administração pública como agora. Médicos, enfermeiros e técnicos fazem coro em reclamar do desrespeitoso modelo gestor, em todas as esferas: municipal, estadual e federal. O funcionário público, muito equivocadamente estigmatizado como aquele vilão que é dispensável e pouco produz, na verdade é peça fundamental para a existência do Estado lato sensu. Para começar, apenas os melhores candidatos são selecionados nos concursos. Diversamente do que se propala, eles têm, sim, metas a cumprir e vigilância no que se lhe atribuem. Devem cumprir dedicação exclusiva, com algumas exceções legais. Se existe alguma deficiência neste setor, sem dúvida, são as remunerações pífias a que se sujeitam. Ainda que não fosse arriscado seu dia-a-dia, permeando os mais distantes rincões de nossa cidade, com exposição a doenças contagiosas, lugares insalubres e violentos, apenas pelo upgrade que proporcionam nas resolutividades terapêutica e propedêutica já justificam sua contratação. 

Nesta semana ouvimos estarrecidos notícias de óbito de dois profissionais, cuja causa mortis provável seja meningite. Pergunta-se: qual a segurança que estes indivíduos têm para trabalhar e salvar a vida do próximo? Seriam apenas elementos descartáveis e acessórios? Precisamos de mais seriedade na condução da sociedade. Pessoas são o bem maior de uma nação. Aceitam-se como plausível as retóricas políticas, mas a politicagem chega a ser degradante! 

Anjos comunitários da Saúde, obrigado pelo trabalho prestado e desculpem a deselegante forma como são reverenciados. 

A sociedade cuiabana só tem a lhes agradecer! 



*ÉZIO OJEDA - médico e advogado, membro da Comissão de Direito Sanitário da OAB/MT 

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