Fonte: João Batista de Oliveira
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A 6ª. Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul desconstituiu sentença que condenou um homem a nove anos de reclusão, em regime fechado, por ter abraçado e tocado a genitália de sua empregada sob as vestes. Como o fato não se deu sob grave ameaça ou violência, o colegiado desclassificou a imputação de estupro para a de assédio sexual, conforme previsto no artigo 216-A do Código Penal.
Os desembargadores entenderam que o ato de tatear o corpo da vítima sobre as vestes configura delito que merece repressão penal, já que agride a esfera de liberdade da assediada. No entanto, a conduta relatada no caso concreto não caracteriza estupro no atual molde penal, nem atentado violento ao pudor, no revogado artigo 214 do Código Penal. ‘‘Não verifico presente qualquer circunstância mais gravosa do que o insinuante abraço (do qual a ofendida facilmente se desvencilhou) e do breve, porém, malicioso contato das mãos do acusado na região pubiana, por sobre a roupa da ofendida, diga-se’’, resumiu o relator do caso no Tribunal de Justiça, desembargador Cláudio Baldino Maciel.
Assim, por se tratar de delito de menor potencial ofensivo, conforme entende a Lei 9.099/95, o caso retornou ao Juizado Especial Criminal de origem, para que o Ministério Público estadual ofereça ao réu proposta de suspensão condicional do processo. A decisão do TJ-RS foi tomada na sessão do dia 1º. de dezembro.
Os fatos que deram ensejo ao processo-crime aconteceram na Comarca de São Sepé, município distante 265 km de Porto Alegre, no dia 18 de fevereiro de 2010. Conforme denúncia oferecida pelo Ministério Público estadual, o comerciante de 68 anos, no interior de sua loja, constrangeu uma de suas funcionárias a permitir que com ele praticasse ato libidinoso.
Conforme detalha o inquérito policial, o empregador adentrou o banheiro da loja no momento em que a empregada lavava as mãos. Ele a abraçou à força, encostando em seus seios. Nesse momento, a vítima esquivou-se. O homem, porém, não desistiu. Voltou a abraçá-la, dizendo: ‘‘guriazinha querida, como eu gosto de ti; tu és especial’’. Ato contínuo, passou a beijá-la no rosto e esfregar os dedos em sua vagina, até que a vítima conseguiu se desvencilhar e fugir.
Em 11 de junho daquele ano, o MP apresentou, perante a Vara Judicial da comarca, uma denúncia de estupro contra o comerciante. Ele foi incurso nas sanções do artigo 213, caput, combinado com o artigo 226, inciso II, ambos do Código Penal.
No curso da fase instrução, foram ouvidos o réu, a vítima, duas testemunhas da acusação e quatro da defesa. O comerciante negou a prática dos delitos, alegando desconhecer o motivo pelo qual a funcionária promoveu a acusação. A defesa pediu a absolvição por atipicidade de conduta, tendo em vista que não existe um dispositivo penal que o incrimine, ou por insuficiência probatória.
Em 14 de abril de 2011, o juiz de Direito Miguel Carpi Nejar proferiu sua sentença. Inicialmente, registrou que, embora o réu tenha negado os fatos, a prova oral trazida aos autos confirma a prática do crime nos exatos termos delineados na denúncia. Destacou, também, que o depoimento da vítima foi seguro, claro e coerente e que a defesa não trouxe qualquer argumento apto a afastar a responsabilidade do réu pelo fato delituoso. ‘‘Portanto, no presente caso, o único convencimento que se forma é o da condenação, porquanto demonstrada a prática de fato típico, inexistindo causas de exclusão da sua antijuricidade ou dirimentes da culpabilidade do agente.’’
O julgador de primeiro grau condenou o comerciante por ter infringido o disposto no artigo 213, caput (constranger, mediante violência ou grave ameaça, para a prática da conjunção carnal ou de outro ato libidinoso).
Ele fixou a pena-base em seis anos de reclusão e aplicou a majorante prevista no artigo 226, inciso II, do Código Penal, já que o réu detinha poder diretivo sobre a vítima no ambiente de trabalho. Com isso, a pena chegou a nove anos, a ser cumprida em regime inicial fechado.
Reviravolta no Tribunal de Justiça
Inconformado com a pesada condenação, o réu apelou ao Tribunal de Justiça. Em sua defesa, bateu na tecla de que inexistiu qualquer violência ou grave ameaça que ensejasse delito configurado no artigo 213 do Código Penal, concluindo pela atipicidade da conduta. Além disso, repisou que os autos não trazem prova segura para a condenação.
No entanto, se mantida a condenação, requereu o afastamento da majorante do artigo 226, inciso II do Código Penal, bem como a desclassificação do delito para o do artigo 216-A do Código Penal (assédio sexual).
O relator da apelação na 6ª. Câmara Criminal, desembargador Cláudio Baldino Maciel, disse, inicialmente, que o contexto probatório traz elementos suficientemente robustos para justificar o decreto condenatório.
Quanto à atipicidade da conduta, o relator afirmou que o ato de tatear no corpo da vítima, sem o consentimento, tocando em seus seios e região genital, por sobre as vestes, configura delito penal descrito no ordenamento jurídico pátrio e merece, sim, repressão penal. No entanto, entende que não se configura estupro no atual molde penal, nem o de atentado violento ao pudor, conforme previa o revogado artigo 214 do Código Penal.
‘‘Do testemunho da vítima, não percebo no comportamento do acusado o emprego de violência ou grave ameaça, condutas elementares do tipo penal. Não verifico presente qualquer circunstância mais gravosa do que o insinuante abraço (do qual a ofendida facilmente se desvencilhou) e do breve, porém, malicioso contato das mãos do acusado na região pubiana, por sobre a roupa da ofendida, diga-se. Desta forma, ausente circunstância elementar do delito, desclassifico a conduta do acusado para o delito de assédio sexual’’, definiu o relator.
Por todo o exposto, o desembargador-relator votou em dar parcial provimento ao apelo para desclassificar a conduta imputada ao réu para o de assédio sexual, conforme previsto no artigo 216-A do Código Penal. Ele desconstituiu a sentença condenatória, manteve a instrução já realizada e determinou a remessa do processo para o Juizado Especial Criminal de origem, tendo em vista que o delito de assédio sexual é de menor potencial ofensivo. Naquela instância, o Ministério Público poderá oferecer ao réu proposta de suspensão condicional do processo, a teor do artigo 89 da Lei 9.099/1995.
A posição do relator foi seguida, à unanimidade, pelos desembargadores João Batista Marques Tovo e Aymoré Roque Pottes de Mello, que preside o colegiado.
Clique aqui para ler a sentença e aqui para ler o acórdão
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