Débora Melo
Do UOL, em São Paulo
- Tércio Teixeira/Futura Press e Adriano Lima/Brazil Photo PressÀ esquerda, o menor suspeito de participar do crime e à direita, Vitor Miguel dos Santos
O responsável por atear fogo no corpo da dentista Cinthya Magaly Moutinho de Souza, 46, foi um adolescente de 17 anos, de acordo com a delegada Elisabete Sato, diretora do DHPP (Departamento Estadual de Homicídios e Proteção à Pessoa), que afirmou que o menor confessou o crime.
A dentista foi queimada viva dentro de seu consultório, em São Bernardo do Campo (ABC Paulista), na quinta-feira (25), após os assaltantes constatarem que havia apenas R$ 30 em sua conta bancária.
A polícia afirma que o menor de idade está com parte do braço queimado. Até a tarde deste sábado, contudo, o adolescente não havia sido submetido ao processo de reconhecimento por testemunhas, o que deve ser feito na próxima semana, ainda segundo a polícia.
"Nós temos neste caso a participação de um menor de idade. É uma questão legal, não podemos divulgar a foto nem o nome. Ele disse que a dentista já estava amarrada, com as mãos para trás, e que ele a ficava ameaçando com um isqueiro", afirmou a delegada, em entrevista coletiva neste sábado (27).
Segundo a polícia, a vítima dizia que não tinha muito dinheiro na conta, mas os criminosos não acreditavam e, por isso, faziam as ameaças. De acordo com a delegada, quando um dos assaltantes ligou dizendo que a vítima tinha R$ 30 no banco, o adolescente teria ficado irritado e ateado fogo.
"O avental [da dentista] pegou fogo e incendiou. Ele conta isso como se estivesse contando o capítulo de uma novela", disse Sato.
"O futuro dele agora depende da decisão do juiz da Vara da Infância e Juventude", afirmou a delegada. Tanto ela quanto o secretário de Estado da Segurança Pública de São Paulo, Fernando Grella Vieira, defenderam a redução da maioridade penal durante a coletiva.
Três detidos confessaram o crime; um está foragido
O adolescente foi capturado pela polícia na madrugada deste sábado (27) na comunidade Santa Cruz, em Diadema (ABC Paulista), com outros dois adultos: Vitor Miguel Souza, 24, e Jonatas Cassiano Araújo, 21. Um quarto suspeito continua foragido --Tiago de Jesus Pereira, 25, que aparece de óculos no retrato falado divulgado ontem (26).
- Retrato falado de Tiago de Jesus Pereira, 25, que continua foragido, segundo a polícia
Os três detidos confessaram o crime, disse o delegado-geral da Polícia Civil, Luiz Maurício Blazeck, na entrevista coletiva.
Vitor Miguel Souza, que já tem passagem pela polícia, seria o "cabeça" do grupo. Segundo o delegado, a polícia conseguiu recuperar a arma do crime e um anel da dentista, que estava na carteira de um dos detidos.
Outros dois adolescentes de 17 anos foram detidos com os suspeitos --um deles dava abrigo aos criminosos-- e também aguardam decisão da Vara da Infância e Juventude. Os três menores de idade já tiveram passagem pela polícia por porte de drogas, segundo Sato.
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O assalto
Os criminosos invadiram a clínica odontológica de Cinthya e dois deles roubaram o cartão de crédito da vítima para fazer um saque em um caixa eletrônico. Após constatarem que a dentista só tinha R$ 30 na conta, eles retornaram ao consultório, atearam fogo em seu corpo e fugiram.
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Cinthya atendia uma paciente --cujo nome não foi divulgado-- quando os criminosos apertaram a campainha. Um dos bandidos disse que precisava de atendimento odontológico, e a dentista abriu o portão, momento em que mais dois criminosos invadiram a casa. A paciente ficou com os olhos vendados durante todo o assalto e teve a bolsa, o celular e dinheiro roubados.
A paciente, segundo a investigação, conseguiu ouvir a dentista gritando "não façam isso" e pedindo socorro. "Ela tentou apagar o fogo quando os bandidos fugiram, mas não foi possível. A dentista morreu em menos de três minutos", disse o delegado seccional de São Bernardo, Waldomiro Bueno Filho.
O consultório de Cinthya funcionava nos fundos de sua casa. Ela morava com os pais e uma irmã, que tem deficiência mental. O pai dela, Viriato Gomes de Souza, 70, afirmou que ela não costumava ficar sozinha em casa no horário do almoço.
"Ela ia buscar a irmã na escola, mas, como tinha uma paciente, eu fui com a minha mulher." Quando o pai chegou à rua, viu a movimentação na frente de casa. Foi avisado pelos vizinhos da morte da filha. "Quis entrar, tentei reanimá-la, mas já não dava para fazer nada", disse.
Emocionado, ele diz não saber o motivo de tamanha brutalidade. "Ela era uma pessoa boa, sem inimigos. Agora, a gente não sabe o que vai fazer da vida, se continuará morando lá. Espero que ninguém precise passar pela dor que estou passando", afirmou.
O corpo de Cinthya foi enterrado nesta sexta-feira (26) no Cemitério Municipal de São Bernardo do Campo. O caixão foi comprado mediante doações dos vizinhos e amigos da vítimas, que se sensibilizaram com a situação da família.
Redução da maioridade penal
O debate sobre a redução da maioridade penal voltou à tona nas últimas semanas, após o assassinato do estudante Victor Hugo Deppman, 19, durante um assalto em frente à sua casa no bairro do Belém, zona leste de São Paulo. O agressor era um adolescente de 17 anos que completou 18 dias depois. Com isso, ele cumprirá pena socioeducativa, pois o crime foi cometido quando ainda era menor.
O secretário de Estado da Segurança Pública de São Paulo, Fernando Grella Vieira,defendeu a redução da maioridade penal durante entrevista coletiva neste sábado (27) sobre o caso da dentista.
"Existe a necessidade de a sociedade debater e exigir a reforma da legislação. Temos uma legislação falha, bastante precária, que deixa desprotegido o cidadão, exposto a esse tipo de violência", disse Vieira.
"O governado Geraldo Alckmin [PSDB] propôs mudanças no ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente]. Agora, temos mais um caso de violência, mais um caso cruel que tem a participação de um adolescente", continuou o secretário.
Alckmin defende um projeto que permite aos juízes estipular internação de até oito anos para o menor que cometer crime hediondo --atualmente, o limite é de três anos.
Hoje, durante visita a Barretos (SP), o governador lamentou a presença de um adolescente no grupo que matou a dentista. "Lamentavelmente mais um menor [está envolvido]. A gente tem visto menores em crimes extremamente hediondos", disse.





