Depois da noite de trabalho, diretor clínico do Hospital Universitário percorreu dez velórios de amigos. Profissionais se apresentaram para trabalhar nas emergências
Marcela Donini, de Santa Maria
Familiares choram durante enterro das vítimas da tragédia em Santa Maria (RS) - Antonio Scorza/AFP
Seis pacientes do HUSM ainda respiram por aparelhos. Entre estes, Luis Arthur Resener de Morais, filho da diretora-geral do hospital, Elaine Resener
A expressão de cansaço e os olhos vermelhos do diretor clínico do Hospital Universitário de Santa Maria (HUSM), Arnaldo Teixeira Rodrigues, refletiam a atmosfera em que a cidade despertou nesta manhã de segunda-feira. "Estou mais deprimido do que ontem", confessou o médico, no início da manhã. O hospital que recebeu cerca de 110 vítimas da tragédia na boate Kiss ainda tinha 37 vítimas do incêndio internados até o final desta manhã. Depois de passar todo o domingo coordenando o atendimento às vítimas, Rodrigues dormiu menos de quatro horas e, só na manhã desta segunda-feira teve noção mais precisa da dimensão da tragédia. E perdeu amigos. Ele trabalhou até as 2h da madrugada e encaminhou-se para o cemitério Santa Rita, onde acompanhou pelo menos 10 velórios de conhecidos até as 4h. Hoje às 8h já estava de volta ao hospital. "A gente se envolveu tanto no atendimento que não tinha a noção exata do que aconteceu", diz.
Seis pacientes do HUSM ainda respiram por aparelhos. Entre estes, Luis Arthur Resener de Morais, filho da diretora-geral do hospital, Elaine Resener. A médica que inicialmente ajudou nos atendimentos agora foi preservada pelos colegas para acompanhar o estado do filho, estudante de Medicina em Santa Catarina.
Em frente ao hospital, familiares aguardavam informações. Teresinha da Silva Rosa queria visitar o quarto do filho Jean Carlo Rosa de Oliveira, 36 anos. Ele estava ao lado do palco quando o fogo começou, conta o irmão, Gilmar. "Ele andou em direção à porta, mas voltou pra procurar outra saída. Acabou desmaiando, mas foi resgatado". A irmã, Luciana, estava chegando à boate quando começou o tumulto. Tentou sair e, num primeiro momento, foi impedida pelos seguranças. Consegui sair e passa bem. Jean Carlo, que respira por aparelhos, nem sabe que os quatro amigos que o acompanhavam na festa acabaram falecendo.
Ao lado da família de Jean Carlo, uma mãe respirava mais aliviada. A filha de Marli Marquezan, Naiara, 23 anos, estava em melhor estado. Depois te der ido para casa após inalar um pouco de fumaça, teve de ser internada porque apresentou sinais de intoxicação, mas passa bem. A estudante de pedagogia da Federal de Santa Maria já estava fora da boate na hora do fogo, aguardava um táxi. Quando viu o tumulto, entrou de volta para buscar uma amiga. "Ela acabou sendo resgatada pelo namorado, que também salvou sua amiga Denise", conta a mãe.
A solidariedade se repete nos corredores dos hospitais. "Nem foi preciso convocar ninguém. Profissionais de todos os setores se apresentaram para ajudar", destaca o diretor clínico.
Fonte: http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/medicos-de-santa-maria-entre-o-trabalho-e-a-dor-da-perda-de-parentes
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