Da Redação
O juiz da Vara Especializada da Ação Civil Pública e Popular, Luiz Aparecido Bertolucci Júnior, negou um pedido de liminar do Ministério Público Estadual para reduzir os ganhos mensais dos 25 vereadores que compõem a Câmara Municipal de Cuiabá. A decisão foi tomada pelo magistrado no dia 12 de março, mas somente nesta semana o presidente João Emanuel Moeira Lima (PSD) foi notificado da decisão.
O MPE havia questionado o fato dos parlamentares terem direito a um salário mensal de R$ 15 mil mais R$ 25 mil a título de verba indenizatória totalizando R$ 40 mil por mês. Em seu pedido, os promotores alegaram que a época os parlamentares estariam recebendo acima do teto do prefeito Mauro Mendes (PSB), que era de R$ 22 mil, e teriam que ter uma redução de R$ 18 mil por mês nos ganhos.
Em seu despacho, o magistrado apontou que o MPE não apresentou provas suficientes para reduzir os valores. Além disto, ele apontou que desde 2010 os parlamentares tem recebido salários e verbas indenizatórias.
VEJA A ÍNTEGRA DA DECISÃO
Trata-se de Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso em face da Câmara Municipal de Cuiabá-MT e de João Emanuel Moreira Lima, objetivando que os réus limitem o valor da verba indenizatória dos Vereadores e também do Gabinete da Presidência da Câmara Municipal de Cuiabá ao teto constitucional.
O Autor, defendendo a presença dos requisitos essenciais para a concessão dos efeitos da antecipação de tutela, postula liminarmente a “concessão de medida liminar antecipada, sem ouvida da parte contrária, com fulcro no art. 461, § 3º do Código de Processo Civil, na forma constante do item acima, obrigando os requeridos a cumprirem obrigação de não fazer consistente em cessar imediatamente a inconstitucionalidade verificada, limitando o valor da verba indenizatória dos Vereadores e também do Gabinete da Presidência da Câmara Municipal de Cuiabá ao teto constitucional, de modo que a verba indenizatória dos Vereadores e também do Gabinete da Presidência da Câmara Municipal de Cuiabá, somada aos subsídios dos Vereadores não ultrapasse o subsídio do Prefeito, fixado em R$ 22.000,00 (vinte e dois mil reais), pela Lei nº 6.644/2013”.
Instruíram a petição inicial os documentos de fls. 30/70.
E o relato do necessário. Decido.
Cumpre destacar que o artigo 12 da Lei n°. 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública) preceitua que “poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo”.
Assim, a lei que regula a ação civil pública, expressamente, confere ao juiz o mesmo poder geral de cautela já consagrado pelo artigo 798 do Código de Processo Civil, do seguinte teor:
“Art. 798. Além dos procedimentos cautelares específicos, que este Código regula no Capítulo II deste Livro, poderá o juiz determinar as medidas provisórias que julgar adequadas, quando houver fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra lesão grave e de difícil reparação.”
Por conseguinte, embora o pedido formulado pelo Autor possua natureza de antecipação de tutela, os requisitos para a concessão da medida liminar na ação civil pública são a existência de plausibilidade do direito afirmado pela parte (fumus boni iuris) e a irreparabilidade ou difícil reparação desse direito (periculum in mora), requisitos esses que são menos rígidos que os exigidos pelo artigo 273 do Código de Processo Civil.
Realmente, não há como compreender e aplicar o artigo 12 da Lei da Ação Civil Publica sem levar em consideração os requisitos do artigo 798 do Código de Processo Civil que a ele também são inerentes. Nesse sentido, é a lição do professor José dos Santos Carvalho Filho, do seguinte teor:
“Na ação civil pública também pode ser concedido o mandado liminar. Embora as medidas cautelares guardem maior adequação com a ação cautelar, a doutrina tem entendido que normas processuais preveem, algumas vezes, esse tipo de providência em diversas ações. É o chamado poder geral de cautela conferido ao juiz pelo art. 798 do Código de Processo Civil, que autoriza a expedição de medidas provisórias quando julgadas necessárias em determinadas situações fálicas. Como bem anota HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, tais providências que carecem da qualidade de processo e ação. apresentam-se essencialmente como acessórios do processo principal, motivo por que não devem sequer ensejar autuação apartada ou em apenso. Aliás, já houve ensejo a manifestação judicial a respeito da possibilidade de ser a medida liminar expedida dentro da própria ação civil pública. O que é importante é que se façam presentes os pressupostos da medida - o risco de lesão irreparável em vista da eventual demora e a plausibilidade do direito. Desse modo, o autor da ação civil pública, vislumbrando situação de risco aos interesses difusos ou coletivos a serem protegidos, pode requerer ao juiz, antes mesmo de formular o pedido na ação, a concessão de medida liminar, a exemplo, aliás, do que ocorre naturalmente em outros procedimentos especiais, como o mandado de segurança e ação popular”. (Ação Civil Pública Comentários por Artigos, 7ª Edição, Ed. Lúmen Júris, Rio de Janeiro - 2009. páginas 356/357)
Vale ressaltar, que não há óbice legal em se aplicar tais requisitos em determinados casos de antecipação de tutela, pois o próprio Código de Processo Civil prevê tal hipótese, como ocorre em casos de obrigações de fazer.
De fato, dispõe o § 3° do artigo 461 do Código de Processo Civil que “sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o réu. A medida liminar poderá ser revogada ou modificada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada”.
Vê-se assim, que o caso em exame exige a presença dos requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora quer seja pela aplicação do artigo 798, quer seja pela aplicação do § 3º do artigo 461, ambos do Código de Processo Civil, pois o presente feito tem como objeto obrigação de não fazer.
Na mesma trilha, inclina-se a jurisprudência do E. Tribunal de Justiça de Mato Grosso. Observe-se:
EMENTA - AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - LIMINAR - PRESENÇA DOS REQUISITOS LEGAIS - CONCESSÃO - PRAZO NÃO RAZOÁVEL PARA CUMPRIMENTO - AMPLIAÇÃO - POSSIBILIDADE - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
O pedido de liminar em ação civil pública deve ser deferido quando presentes os seus requisitos (fumus boni iuris e periculum in mora).
O prazo de cumprimento de liminar concedida deve ser ampliado quando fixado de forma não razoável. (TJMT. 4ª Câmara Cível. Des. José Silvério Gomes. Agravo de Instrumento n° 38154/2009. Data de julgamento: 21.9.2009) (sem destaques no original)
EMENTA - AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - LIMINAR - DEFERIDA - PRESENTE OS REQUISITOS DO PERICULUM IN MORA E FUMUS BONI IURIS - RECURSO DESPROVIDO - DECISÃO MANTIDA. Deve ser mantida a decisão recorrida que ao deferir liminar nos autos da ação civil pública, observou os requisitos do periculum in mora e do fumus boni iuris. (TJMT. 1ª Câmara Cível. Rel. José Mauro Bianchini Fernandes. Agravo de Instrumento n° 5169/2008. Data de Julgamento: 24.11.2008) (sem destaques no original).
Denota-se da jurisprudência, que os demais Tribunais pátrios comungam de modo idêntico.
Ementa - AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. POSSIBILIDADE. OBRIGAÇÃO DE FAZER. POLÍTICA DE GOVERNO. IMPLANTAÇÃO DE 23 CONSELHOS TUTELARES NO DISTRITO FEDERAL. DECLARAÇÃO INCIDENTAL DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 3º DA LEI DISTRITAL N° 2.640/2000. CAUSA DE PEDIR. COM FIXAÇÃO DE MULTA DIÁRIA POR DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL. DECISÃO POR MAIORIA.
A JURISPRUDÊNCIA VEM SE INCLINANDO PARA A POSSIBILIDADE, EM CARÁTER EXCEPCIONAL E DIANTE DAS NUANCES DO CASO CONCRETO, DE MEDIDAS DE CARÁTER SATISFATIVO DESDE QUE PRESENTES OS PRESSUPOSTOS ESPECÍFICOS DO FUMUS BONI IURIS E O PERICULUM IN MORA E SEMPRE QUE A PREVISÃO REQUERIDA SEJA INDISPENSÁVEL À PRESERVAÇÃO DE UMA SITUAÇÃO DE FATO QUE SE REVELE INCOMPATÍVEL COM A DEMORA NA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NO CASO CONCRETO, COMO BEM RESSALTOU O BRILHANTE VOTO DO EXMO. DES. RELATOR, VOTO VENCIDO, E A PRÓPRIA DECISÃO OBJURGADA, A FALTA DE INSTALAÇÃO DE NOVOS CONSELHOS TUTELARES VIOLA, DE MODO IMEDIATO, OS DIREITOS E INTERESSES DAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES DE TODO O DF. O PODER JUDICIÁRIO VEM INTERPRETANDO AS NORMAS PROGRAMÁTICAS DE FORMA A NÃO TRANSFORMÁ-LAS EM PROMESSAS CONSTITUCIONAIS INCONSEQUENTES NEGOU-SE PROVIMENTO AO AGRAVO. (T.TDF. 1ª Turma Cível. Classe do Processo: 2009 00 2 006335-5 AGI - 0006335-54.2009.807.0000 Rei. Natanael Caetano. Data de Julgamento: 02.9.2009) (sem destaques no original).
EMENTA - AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA MEDIDA LIMINAR. LIVRE CONVENCIMENTO DO JUIZ. I - O deferimento ou denegação de liminar submete-se ao poder geral de cautela do juiz, segundo o princípio do livre convencimento, de acordo com a adequada avaliação do conjunto probatório carreado aos autos, com destaque para a arguição dos pressupostos autorizadores da medida - fumus boni júris e periculum in mora. Ausentes tais requisitos e não demonstrada a incompatibilidade ou ilegalidade da decisão, mister a sua manutenção. AGRAVO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJGO. 5a Câmara Cível. Agravo de instrumento: 494755-13.2009.8.09.0000. Rei. Carlos Roberto Favaro. Data de Julgamento: 05.8.2010) (sem destaques no original)
Partindo dessas premissas, passa-se à análise da pretensão liminar do Autor.
Não obstante o vertido pelo Autor, constata-se que, ao menos em sede de cognição não exauriente, não restou devidamente caracterizado o fumus boni iuris, pois em que pese a inserção, na exordial, de quadro esquematizado com o histórico da legislação pertinente a subsídio e verbas de natureza indenizatória, dos vereadores e Prefeito, esses dados – produzidos unilateralmente – por si só, são insuficientes para concluir pela inexistência de legislação, publicada antes da Emenda Constitucional nº 41/2003, que regia a matéria.
Ademais, o periculum in mora também não restou comprovado, pois, conforme informa o autor, a verba indenizatória em comento vem sendo percebida desde o ano de 2010, ou seja, há mais de 2 (dois) anos e 10 (dez) meses da distribuição da petição inicial, de modo a tornar-se patente a não caracterização do “perigo da demora” defendido pelo autor.
Destarte, diante da ausência dos pressupostos ensejadores para a concessão da medida liminar, indefiro a tutela de urgência.
Citem-se os réus para querendo, apresentarem defesa, no prazo legal.
Decorrido o prazo supra, intime-se o autor para, querendo, impugnar a contestação.
Expeça-se o necessário.
Intimem-se e cumpra-se.





