Manaus contabiliza, em média, 12 crimes por dia contra adolescentes


Delegacia Especializada em Proteção à Criança e ao Adolescente contabiliza 2,4 mil denúncias nos sete primeiros meses deste ano, sendo 1,5 mil de abuso sexual e violência física.
[ i ] As meninas entre 12 e 15 anos são as principais vítimas da violência sexual e agressão física, praticadas, na maioria das vezes, pelo pai ou padastro
Manaus - Em média, 12 adolescentes, com idades entre 12 e 17 anos, sofrem algum tipo de violência em Manaus todos os dias.
Segundo dados da Delegacia Especializada em Proteção à Criança e ao Adolescente (Depca), nos primeiros sete meses deste ano, foram 2,4 mil denúncias, sendo que destas 1,5 mil correspondem a ocorrências sexuais e lesões corporais. As demais são de abandono de incapaz, calúnia, difamação, injúria, constrangimento e abandono intelectual.
No entanto, o número de vítimas é bem maior, uma vez que muitos casos não chegam ao conhecimento da polícia.
As principais vítimas da violência física e sexual são as meninas com idades entre 12 e 15 anos, residentes principalmente nas zonas leste e norte da capital, segundo levantamento da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Amazonas (SSP-AM).
O delegado em exercício da Depca, Rafael Allemand, informou que os pais são os principais responsáveis pelos crimes de agressão física. “Geralmente, são homens com histórico na Delegacia da Mulher e que apresentam dependência química ou alcoólica”, informou.
Nos casos de violência sexual, pais e padastros aparecem no topo da lista como os principais autores do crime. Allemand destacou que, na maioria das vezes, as mães das vítimas estão cientes do crime e o acobertam por motivos financeiros.
“Estes homens, mesmo que não tenham um emprego regularizado, são responsáveis pelo sustento da família. Com medo de perder esse apoio, além da reação do homem à denúncia, elas decidem ficar em silêncio”.
Na maioria das vezes, segundo o delegado, a denúncia acontece apenas após problemas no relacionamento do casal. “Infelizmente, quando as mães denunciam o crime, só o fazem depois de algum ato de violência contra elas mesmas e não pelos filhos”, disse Allemand.
Nos casos em que as mães das vítimas sabem dos crimes e não denunciam os parceiros, elas são classificadas como coautoras da violência. A medida é afastar a vítima do agressor, nos casos familiares.
“Pedimos medida protetiva à Justiça. Em casos extremos, como estupro pelo próprio pai, retiramos o menor do ambiente nocivo e o encaminhamos para a Central de Resgates. De lá, ele é transferido para o lar do familiar mais próximo depois dos pais”, explicou.
Allemand informou que a Depca costuma acompanhar as famílias que apresentem mais de um filho em situação de violência. Segundo ele, estas famílias costumam apresentar mães jovens alcoólatras e de baixa renda. “Arrisco a dizer que em quase 100% dos casos de famílias numerosas, todos os filhos são vítimas de algum tipo de violência”, afirmou.
O delegado informou que a Depca conta com psicólogos e assistentes sociais para realizar a triagem dos crimes. “Estes profissionais ajudam as crianças e os adolescentes a verbalizar o crime. Eles emitem um laudo que comprova ou não a violência”. A partir daí, a vítima é encaminhada para outros setores do Estado. “A delegacia tem uma demanda muito grande e não conseguiríamos continuar o tratamento psicológico com as vítimas. Assim que elas passam por aqui, são redirecionadas para o Centro de Referência Especializado em Assistência Social (Creas)”, explicou.
A Depca está localizada na Rua 6, na Quadra 7, no Conjunto Vista Bela, Planalto.
Semsa registrou  17 casos de gravidez pós-estupro este ano
Segundo a Secretaria Municipal de Saúde (Semsa), neste ano, Manaus registrou 17 casos de gravidez após violência sexual, sendo que as adolescentes de 12 a 15 anos encabeçam a lista. Esta faixa etária representa 34% do total dos casos de estupros registrados em Manaus este ano, seguida de crianças de 7 a 11 (23%) e de 0 a 6 anos (21%).
Jovens entre 20 e 24 anos também aparecem no levantamento da Semsa, com 6% dos casos e mulheres com mais de 25 anos (7%).
Das 17 mulheres que engravidaram após o estupro, 15 seguiram com a gestação. Para este tipo de caso, a Semsa conta com o Serviço de Atendimento a Vítimas de Violência Sexual (Savvis). O programa tem a participação de profissionais voluntários nas áreas de Psicologia e Psiquiatria.
Unicef  lança campanha mundial
A violência contra meninas e meninos, frequentemente, não é vista, ouvida, ou denunciada, disse o Unicef na quarta-feira ao anunciar uma iniciativa que convoca cidadãos, legisladores e governos de todos os países a se pronunciar de forma mais contundente em relação à violência contra crianças e adolescentes.
A iniciativa foi criada no contexto da crescente indignação popular que eclodiu após os terríveis ataques a crianças ocorridos ao redor do mundo como os disparos contra Malala Yousafzai, na época com 14 anos, no Paquistão, em outubro de 2012; o assassinato de 26 alunos e professores em Newtown, Connecticut, em dezembro de 2012; e os estupros coletivos de meninas, ocorridos na Índia e na África do Sul em 2013.
“Em cada país, em cada cultura, há violência contra meninos e meninas,” disse o diretor executivo do Unicef, Anthony Lake. “Sempre que crianças são feridas e onde quer que elas estejam, devemos mostrar e expressar nossa indignação e nossa raiva. É preciso que tornemos o invisível visível”, afirmou.
O lançamento da iniciativa foi marcado pela divulgação de um vídeo narrado pelo ator e embaixador do Unicef, Liam Neeson, que mostra uma série de cenas que representam a violência invisível.
“Esta é uma menina de 15 anos sendo estuprada por várias pessoas”, diz ele enquanto a câmera mostra um local abandonado. “Este professor está batendo em um menino que respondeu a ele, enquanto o resto da turma assiste a tudo. Só porque você não consegue ver a violência contra crianças, não significa que ela não exista”, diz Neeson. “Torne o invisível visível. Ajude-nos a fazer a violência desaparecer. Una-se a nós. Levante sua voz!”, conclama o anúncio.