Grupo pede ação contra pedófilos

Vítimas de pedofilia querem que a ONU se manifeste contra abusos sexuais de padres católicos

Roma No último dia do pontificado de Bento XVI, um grupo de apoio a vítimas de abusos sexuais cometidos por clérigos pediu à Organização das Nações Unidas (ONU) que repreenda o Vaticano por sua incapacidade de proteger crianças e adolescentes contra esses crimes. 

Carta enviada ao Vaticano pede que cardeal mexicano (centro) não esteja no conclave Foto: Reuters

Apesar da guinada radical na luta contra a pedofilia durante os oito anos do papado de Joseph Ratzinger, os abusos cometidos por sacerdotes ainda são um dos mais importantes temas pendentes da Igreja, que mancham não apenas a sua imagem no mundo, mas também a relação com os católicos.

Numa entrevista coletiva a poucos metros dos muros do Vaticano, ontem, o presidente da Rede de Sobreviventes dos Abusados por Padres (Snap, na sigla em inglês da organização) informou que seu grupo fez uma solicitação formal ao Comitê da Organização das Nações Unidas para os Direitos da Criança.

“É uma longa apresentação de 30 páginas baseada em relatórios governamentais de cinco nações”, disse David Clohessy a jornalistas, cercado por fotos de crianças que ele disse serem hoje integrantes adultos da sua organização de vítimas.

“Esperamos que a ONU se pronuncie de forma muito incisiva, e diga que o Vaticano está em violação do tratado que concordou em honrar”, afirmou.

A Snap argumentou que a Santa Sé violou quatro itens da Convenção da ONU para os Direitos da Criança, que o Vaticano assinou em 1990. As violações incluiriam a não-proteção às crianças e a não-cooperação com investigações criminais.

A crise por causa dos abusos clericais contra crianças, que levou à falência várias dioceses dos Estados Unidos, obriga a Igreja a gastar bilhões de dólares em indenizações no mundo todo, e assolou todo o pontificado de Bento XVI. O assunto voltou à tona agora que os cardeais se preparam para iniciar um conclave que elegerá o sucessor dele.

Ativistas católicos já pediram ao cardeal norte-americano Roger Mahony, que na década de 1980 protegeu padres sabidamente abusadores, para que se exima de participar da eleição do novo papa.

Clohessy pediu que o próximo papa, que se espera ser escolhido até 26 de março, puna imediatamente bispos que tenham protegido padres abusadores nas suas dioceses.

“Essa é a maior instituição religiosa do planeta, com imenso poder centrado bem aqui. Com uma canetada, o papa poderia fazer uma diferença enorme”, disse Clohessy.

Denúncias

Os casos de abusos sexuais começaram a vir à tona na década de 1980, mas só se tornaram uma crise grave em 2002, após reportagens na imprensa dos Estados Unidos. Quando ainda era cardeal, com o nome de Joseph Ratzinger, Bento XVI foi nomeado pelo então papa João Paulo II para liderar um órgão da Santa Sé encarregado de investigar os abusos cometidos.

Como papa, Bento XVI fez mais do que qualquer antecessor seu para tratar da questão, reunindo-se várias vezes com as vítimas e pedindo perdão pelos abusos. Mas Clohessy disse que ele poderia ter ido mais longe.
“Ele tinha tanto o poder quanto o conhecimento para fazer uma diferença enorme, e acreditamos que se recusou”.

As vítimas de abuso sexual e pedofilia por parte de padres publicaram uma carta para exigir que o cardeal Norberto Rivera Carrera, primaz da Igreja Católica no México, se abstenha de participar do conclave para eleger o sucessor do Bento XVI.

Veto a mexicano

Os autores do documento assinalam que o cardeal Rivera Carrera acobertou vários padres pedófilos, incluindo o finado Marcial Maciel, fundador da congregação Legionários de Cristo e acusado de pedofilia.

“Exigimos que o cardeal Norberto Rivera Carrera não participe do Conclave que ocorrerá no Vaticano em março”, destaca a carta firmada por José Barba Martín e Joaquín Aguilar, vítimas de abuso sexual, e por Alberto Athié, ex-sacerdote defensor de vítimas de pedofilia.

Desde 1997, quando os abusos de Maciel surgiram na imprensa mexicana, Rivera Carrera “jamais se arrependeu publicamente de seus insultos às vítimas ou reconheceu publicamente sua responsabilidade por acobertar Marcial Maciel e muitos sacerdotes pedófilos”. Também “não pediu perdão público às vítimas por todos os danos durante tantos anos”.

A carta acusa ainda o cardeal Rivera Carrera de autorizar a transferência do padre Nicolás Aguilar a Los Angeles, Califórnia, onde abusou de 26 menores, mesmo após violentar vários meninos em Tehuacán, Puebla, no centro do México.

O documento cita ainda o caso de Carlos López, que abusou de vários menores em uma igreja no sul da Cidade do México, denúncia que foi ignorada por Rivera Carrera.

Em uma das decisões mais emblemáticas de seu papado, Bento XVI obrigou Marcial Maciel, em maio de 2006, a “renunciar a todo ministério” e a se “retirar para uma vida de orações”. Marcial Maciel morreu em 2008.

Entre outras medidas, o papa reforçou em 2010 as sanções contra a pedofilia com procedimentos acelerados para os casos mais urgentes, o aumento de dez para vinte anos do período de prescrição ou a condenação da pornografia infantil.

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