Crianças e adolescentes protagonizam violência doméstica em Alagoas


Especialista alerta a influência externa que provoca comportamento agressivo dentro de casa
Karoline Torres - Estagiária*
Crianças e adolescentes têm se envolvido cada vez mais com a violência e criminalidade. Pelo menos três casos ocorridos em Alagoas, nos últimos meses, mobilizaram autoridades policiais e deixaram a população alarmada. As situações não se restringem apenas ao tráfico de drogas, assaltos ou homicídios cometidos pelas ruas. Especialista explica que os jovens acabam levando o comportamento agressivo para dentro de casa. Convivência e estrutura familiar, situações traumáticas vividas na infância, ciúmes, inveja, mídia, jogos de videogame e o fascínio pelo proibido são alguns dos fatores que influenciam meninos e meninas a cometerem crimes.

Segundo a psicóloga infantil Lívia de Oliveira Rocha, crianças e adolescentes tem apresentado cada vez mais comportamentos agressivos, mais especificamente comportamentos destrutivos e punitivos. “Estas ações envolvem uma carga de emoção de raiva, que é uma condição necessária, mas insuficiente, para o desenvolvimento de posturas hostis e para a manifestação de comportamento agressivo”, explicou.

Abalos emocionais na infância e adolescência são muito intensos e podem levar a atitudes impulsivas como forma de proteção, de acordo com a profissional. “Nessa idade, o abalo emocional parece estar diretamente ligado ao impulso irracional de aniquilação do que incomoda, ao invés da elaboração e comunicação desses conteúdos”, detalhou Lívia. A psicóloga infantil destaca que estrutura emocional está baseada na insegurança e na ameaça do ‘eu’ que abre espaço ao imediatismo, ao agir sem pensar nas consequências. De acordo com a especialista, a criança ou o adolescente quer acabar com a dor e isso pode levá-los a deixar de lado a consciência da realidade.

A mídia e jogos com armas, lutas e similares, sejam de vídeo games ou até mesmo nos computadores, também têm influência sobre o comportamento desses jovens. “Estes meios provocam cada dia mais a realização desse comportamento violento. A fantasia se mistura à realidade e a vida se torna um jogo de agressões onde não há limites para sua expressão”, defendeu Lívia de Oliveira.

O apoio, cuidado e vigilância dos pais são imprescindíveis nesta fase de construção e mudanças, segundo a psicóloga. “É preciso direcionar esses jovens na trilha de um caminho saudável, de autoconhecimento e no controle das suas emoções, dos seus impulsos, ajudando na passagem dessa fase de transição tão difícil para alguns”, alertou.

Menor de 12 anos pode ter atirado impulsivamente na irmã de 14 para se livrar de dor

Em dezembro de 2012, Juliane de Almeida Santos, de 14 anos, morreu após levar um tiro enquanto dormia, no loteamento Santa Maria, no Tabuleiro dos Martins. J.A.S, de 12 anos, irmã da vítima, assumiu ter disparado contra Juliane, mas garantiu que foi acidental. J.A.S relatou que brincava com a arma e estava distante da irmã quando tudo aconteceu. Já a perícia concluiu que o tiro foi à queima roupa.

As duas adolescentes faziam parte de um projeto social que envolvia futebol. Juliane se dedicava e acabou se destacando. Estava para ir jogar no Corinthians Alagoano. Os vizinhos relataram à polícia que já ouviram as irmãs discutirem e Juliane pedia que J.A.S se dedicasse ao futebol. A Polícia Militar então levantou a suspeita que o fator que motivou o crime tenha sido ciúmes ou inveja.

J.A.S e o irmão de 16 anos, J.C.A, eram suspeitos de cometerem assaltos naquela região. A adolescente chegou a dizer na delegacia que estava ali ‘para matar e para morrer, que não tinha medo de morrer e que era assim mesmo’, segundo um PM.

Para a psicóloga infantil Lívia de Oliveira, esse caso retrata a perda do sentido da realidade e o sentimento de inferioridade. Partindo da suspeita da PM, a profissional traz a definição de ciúme e inveja para esclarecer os possíveis sentimentos que possam ter influenciado a menor a cometer o crime. “Ciúme é a desconfiança geral, de tudo e de todos, perdendo-se o sentido da realidade. Inveja é o ódio do outro por não ter o que o mesmo tem, e o sentimento de inferioridade que tal situação atrai”, explicou.

A psicóloga explica que isto, aliado ao anseio de J.A.S de se livrar da dor que sentia, por meio de atitudes impulsivas, são fatores que podem ter levado a menor à disparar a arma contra irmã.

Menores que espancaram irmão podem ter sido influenciados pela mídia e jogos

Na noite do dia 05 de fevereiro deste ano, dois menores de 11 e 13 anos espancaram o irmão paterno de 2 anos, Denisson Arthur Miranda Neto, que morreu antes de chegar ao Hospital Geral do Estado (HGE). Os dois menores admitiram ter agredido o irmão, mas alegaram que não queriam matar o menino. Segundo eles, os dois, de 11 e 13 anos, estavam ‘brincando de luta’ e Denisson entrou na ‘brincadeira’.

Os três foram deixados sozinhos em casa pelo pai, Daniel Leal Melo. A mãe de Denisson é usuária de drogas e passava dias longe de casa e do filho, de acordo com o Conselho Tutelar.

A avó materna da vítima, Maria Vivência de Oliveira, durante o velório de Denisson, disse não culpar o pai ‘porque ele é um batalhador’. Entretanto, Vivência acredita que o crime não foi sem intenção. “Esses adolescente sabiam o que estavam fazendo. Tenho certeza que eles tinham noção, porque crianças com muito menos idade já têm consciência. Tenho certeza que aquele bebê sofreu na mão deles”, lamentou.

Analisando de forma psicológica, Lívia de Oliveira encaixa esta ‘brincadeira de luta’ onde existe a mistura entre fantasia e realidade. Desta forma, as agressões não teriam limites para sua expressão. Outro fator é a influência da televisão e jogos. “O proibido, a curiosidade, a novidade, em geral, tem exercido um papel de deslumbre e fascínio em nossas crianças e adolescentes, fazendo com que não diferenciem a realidade da fantasia”, acrescentou.

Caso Lucas Lins: fascínio pela arma de fogo e pelo poder que ela representa

Durante o carnaval, no sábado de Zé Pereira (09), o adolescente de 16 anos Lucas Lins levou um tiro no instante em que estava na companhia do amigo L.J.H., de mesma idade, em um apartamento na Jatiúca. Segundo a polícia, os dois menores estavam ‘brincando’ com a arma do pai de L.J.H, quando o revólver disparou. O tiro acertou Lucas, que chegou a ser levado ao HGE, mas não resistiu ao ferimento.

De acordo com Lívia de Oliveira, armas exercem fascínio nos adolescentes e pode ter motivado a ‘brincadeira’. “O sentimento de poder e autoridade que as armas de fogo trazem são indiscutíveis. E nessa fase de transição ela representa o que eles buscam a todo instante”, esclareceu.


Como funciona a Justiça e a recuperação dessas crianças e adolescentes

Depois que é comprovado que a criança ou o adolescente são, de fato, autores do crime, as medidas são tomadas de formas diferentes para cada um. No caso de crianças (0 a 12 anos incompletos) é de responsabilidade do Conselho Tutelar aplicar as medidas protetivas. Já o adolescente (12 a 18 anos incompletos) fica sob responsabilidade da polícia e da Justiça.

Os pais são chamados para conversar e auxiliar no processo de recuperação da criança. Caso ela não esteja na escola, deve ser inserida e frequentar o colégio. A criança pode também ser inserida em projetos sociais para melhorar o convívio social. O conselho deve garantir o bem-estar do menor para que não venha a se envolver com a criminalidade no futuro, segundo Valdomiro Pontes Jardins, coordenador da Equipe Multidisciplinar do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas).

Para o adolescente, após comprovada a culpa, o juiz decidirá qual medida socioeducativa deve ser aplicada. Pode haver internação na Unidade de Internação Masculina por até três anos.

Valdomiro destaca a importância dos pais no processo de recuperação da criança e do adolescente e que a falta deles pode prejudicar. “A família é muito importante neste processo e o distanciamento dela dificulta a recuperação dos jovens. Alguns pais não levam os filhos para as consultas psicológicas quando são recomendadas”, pontuou.

*Edição: Thiago Gomes

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